Nos bastidores da viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Portugal e Espanha, integrantes da comitiva consideraram “um sucesso” a estratégia do governo, que foi obrigado a estancar a crise criada na sequência das declarações polêmicas sobre a invasão da Ucrânia pela Rússia.
Isso foi dito mesmo com a visita de Lula debaixo de críticas, protestos e com o presidente tendo recuado nas suas primeiras declarações, que geraram críticas de líderes europeus e dos Estados Unidos.
Mas, na avaliação de quem acompanhou Lula, o presidente conseguiu, nas viagens, esclarecer que condena a “violação territorial da Ucrânia”. Frase que usou mais de uma vez, uma delas em seu discurso no Parlamento de Portugal.
Apesar de o presidente ouvir de políticos de ambos os países condenações mais duras sobre a invasão, interlocutores da comitiva avaliam a viagem como positiva para a afirmação da posição do Brasil sobre o tema, que tem se tornado uma espécie de obsessão para Lula.
A análise é que a escalação do ex-chanceler Celso Amorim para visitar a Ucrânia, ideia anunciada após um protesto da Associação de Ucranianos em frente à Embaixada do Brasil em Lisboa, originou a primeira medida diplomática prática após a fala de Lula.
Ao ser oficializado como o interlocutor de um líder que ambiciona mediar o conflito, ao mesmo tempo em que Lula visitava políticos europeus e tecia a sua ideia de montar um grupo mundial de negociação pela paz, Amorim pôde se reunir na Colômbia com representantes da União Europeia e dos EUA.
Entre eles estava Josep Borrell, alto representante da UE para Negócios Estrangeiros e Política de Segurança, que refuta a mediação do conflito à distância. Foi um encontro importante para tentar transmitir pessoalmente a Borrell a posição do governo brasileiro, que Lula chamou de “terceira via”. Dois dias antes, o espanhol, chefe da diplomacia europeia, havia desafiado Lula:
— Recentemente, surgiram algumas ideias a propósito da paz da parte da China e também do Brasil. Para haver esforços de paz credíveis é necessário falar com Kiev e ir lá, ver a agressão pelos olhos deles, pelos olhos dos que estão a ser bombardeados. (…) Não podemos aceitar esta abordagem benevolente. Não podemos nivelar o agressor e o agredido.
Como reparou o jornal espanhol “El Pais”, que traz uma entrevista com Lula na manchete de hoje, o presidente tenta escolher melhor as palavras para não prejudicar sua ambição de ser um mediador global. Ao mesmo tempo, Lula já disse entender, mas não concordar, com o envio de armas da UE para os ucranianos se defenderem. E afirma que não sabe a quem pertence a Crimeia, anexada pela Rússia há nove anos. São declarações ambíguas que embaralham o diálogo com os europeus e poderiam até reverter o “sucesso” da viagem.